quarta-feira, 18 de agosto de 2021

RIP

aqui jazem

as puras, 

sem artifícios,

e essencialmente

desarticuladas

partes da 

minha alma.


amanda lovelace



terça-feira, 17 de agosto de 2021

Lindo

Nos teus versos, a certa altura não sei se leio ou se vivo.

Álvaro de Campos

Poema em linha recta

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.

Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.


E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,

Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,

Indesculpavelmente sujo,

Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,

Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,

Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das

etiquetas,

Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,

Que tenho sofrido enxovalhos e calado,

Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;

Eu, que tenho sido cómico às criadas de hotel,

Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,

Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,

Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado

Para fora da possibilidade do soco;

Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,

Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.


Toda a gente que eu conheço e que fala comigo

Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,

Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...


Quem me dera ouvir de alguém a voz humana

Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;

Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!

Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.

Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?

Ó príncipes, meus irmãos,


Arre, estou farto de semideuses!

Onde é que há gente no mundo?


Então sou só eu que é vil e erróneo nesta terra?


Poderão as mulheres não os terem amado,

Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!

E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,

Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?

Eu, que venho sido vil, literalmente vil,

Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.


Álvaro de Campos

Concordo

Rochefoucauld acreditava que a maledicência provinha mais da vaidade do que da malícia.

segunda-feira, 16 de agosto de 2021

[c]alma

[c]alma

de calma
transpira
a alma

confessa
o presente
arruma
o passado 
traduz
o futuro
disfarça
o mais duro

desenha
o momento
consola
o relento
revela
o amor
medica
a dor

existe
com
[c]alma


Definição

Ao lermos grande poesia, frequentemente, ficamos com aquela sensação de: "Oh, já conhecia isto só não sabia exprimi-lo".

Silêncio na Era do Ruído, Erling Kagge

Pilares

Os céus estrelados sobre mim e as leis morais no meu interior.

Immanuel Kant