Poesia é... o espelho do poeta é um elefante imitando uma gazela é o que nós quisermos.
Adília Lopes
Poesia é... o espelho do poeta é um elefante imitando uma gazela é o que nós quisermos.
Adília Lopes
Pediram-me um texto sobre a consistência. Acho muito abstracto para mim. Em que consiste a consistência? Quem vigia os vigilantes? Não vale a pena desconversar. Comprei gelatina de ananás, uns copos, estava líquida, estragada, não tinha a consistência da gelatina. Mas os líquidos também têm a sua consistência, só que não é a da gelatina. Cada coisa tem a sua consistência. Uma cadeira do curso de Física de que gostei muito foi Física da matéria condensada. Um texto tem de ter consistência. Pode não ser a do aço, do betão. O soro, o ar também têm consistência. Faz-se um bolo, deitam-se os ingredientes para uma tigela, mexe-se com a colher e a colher fica em pé. A massa tem consistência. Massa de pão? Há tex-tos que têm a consistência do ar. E há o vazio. A consistência do vazio. A consistência do mundo, do infinito.
Adília Lopes
Questões de juízo diferem de questões de opinião ou gosto, nas quais é inteiramente aceitável que haja diferenças.
Ruído, Daniel Kahneman
"A oportunidade é perdida pela maioria das pessoas, porque ela está vestida com um fato macaco e aparenta ser trabalho."
Thomas Edison
A maior parte das pessoas vive grande parte do tempo com a incontestada convicção de que o mundo parece o que parece porque é o que é.
Ruído, Daniel Kahneman
A poesia não me pede propriamente uma especialização pois a sua arte é uma arte do ser. Também não é tempo ou trabalho o que a poesia me pede. Nem me pede uma ciência nem uma estética nem uma teoria. Pede-me antes a inteireza do meu ser, uma consciência mais funda do que a minha inteligência, uma fidelidade mais pura do que aquela que eu posso controlar. Pede-me uma intransigência sem lacuna. Pede-me que arranque da minha vida que se quebra, gasta, corrompe e dilui uma túnica sem costura. Pede-me que viva atenta como uma antena, pede-me que viva sempre, que nunca me esqueça. Pede-me uma obstinação sem tréguas, densa e compacta.
Pois a poesia é a minha explicação com o universo, a minha convivência com as coisas, a minha participação no real, o meu encontro com as vozes e as imagens. Por isso o poema não fala de uma vida ideal mas sim de uma vida concreta: ângulo da janela, ressonância das ruas, das cidades e dos quartos, sombra dos muros, aparição dos rostos, silêncio, distância e brilho das estrelas, respiração da noite, perfume da tília e do orégão.
É esta relação com o universo que define o poema como poema, como obra de criação poética. Quando há apenas relação com uma matéria há apenas artesanato.
É o artesanato que pede especialização, ciência, trabalho, tempo e uma estética. Todo o poeta, todo o artista é artesão de uma linguagem. Mas o artesanato das artes poéticas não nasce de si mesmo, isto é, da relação com uma matéria, como nas artes artesanais. O artesanato das artes poéticas nasce da própria poesia a qual está consubstancialmente unido. Se um poeta diz «obscuro», «amplo», «barco», «pedra» é porque estas palavras nomeiam a sua visão do mundo, a sua ligação com as coisas. Não foram palavras escolhidas esteticamente pela sua beleza, foram escolhidas pela sua realidade, pela sua necessidade, pelo seu poder poético de estabelecer uma aliança. E é da obstinação sem tréguas que a poesia exige que nasce o «obstinado rigor» do poema. O verso é denso, tenso como um arco, exactamente dito, porque os dias foram densos, tensos como arcos, exactamente vividos. O equilíbrio das palavras entre si é o equilíbrio dos momentos entre si.
E no quadro sensível do poema vejo para onde vou, reconheço o meu caminho, o meu reino, a minha vida.
Sophia de Mello Breyner Anderson
"O tempo das verdades plurais acabou. Vivemos no tempo da mentira universal. Nunca se mentiu tanto. Vivemos na mentira, todos os dias."
José Saramago